Em 25 de maio de 2013 por Jana Coimbra
Duas iguarias produzidas e aperfeiçoadas, com o auxílio de bactérias
Os diversos tipos de queijos e vinhos são muito apreciados pelos amantes da boa culinária. Essas duas iguarias vêm sendo produzidas e aperfeiçoadas pelas mais antigas civilizações até a atualidade. Do vinho e do queijo mais simples até os mais sofisticados, os diferentes tipos e sabores são determinados não só pela matéria prima utilizada, como também, pelas bactérias aplicadas à cultura de cada um.
Segundo relatos, o queijo teria surgido há, aproximadamente, doze mil anos antes de Cristo, durante o período Paleolítico Superior. Mas segundo a mitologia, o queijo teria sido descoberto por um dos filhos de Apolo, Aristeu, Rei da Arcádia.
Primeiros povos a explorarem a pecuária, os egípcios tinham no leite e no queijo grande fonte de alimentação. Queijos feitos de leite de vaca, de cabra e de ovelha foram encontrados em muitas tumbas egípcias. Passagens bíblicas registram o queijo como um dos alimentos da época.
Já na Europa, os gregos foram os primeiros a adotá-lo em seus cardápios, feito exclusivamente com leite de cabras e de ovelhas, animais que criavam. Mas foram os romanos os responsáveis pela maior divulgação dos queijos pelo mundo. Na expansão de seu Império eles levaram vários tipos de queijos a Roma. Elevaram o nível do queijo, transformando-o de simples alimento para uma iguaria indispensável nas refeições dos nobres e em grandes banquetes imperiais.
Com o passar do tempo, o queijo evoluiu até os que conhecemos hoje, transformando-se num produto de consumo com apreciadores espalhados pelos quatro cantos do mundo.
A técnica de fabricação é basicamente a mesma para todo tipo de queijo, depois de pasteurizado e resfriado a temperatura desejada, o leite deve ser inoculado com uma cultura que vai dar ao produto as características desejadas. Bactérias lácticas que acidificam e aromatizam o leite, modificando sua viscosidade. Os microrganismos utilizados dependem essencialmente da temperatura de trabalho.
O Streptococcus lactis é usado a 15 e 18oC, para fabricação de pastas frescas, e 20 a 32oC, para fabricação de pastas moles, Streptococcus thermophilus e Leuconostoc helveticus, para produção do Gruyére, é trabalhado entre 40 e 50oC.
Na maioria dos casos, empregam-se misturas de microrganismos com temperaturas diferentes de desenvolvimento para que possam agir em mais de uma etapa do processo, fungos neutralizam a coalhada dando queijos de pasta mole. Os principais microrganismos utilizados são culturas de Penicillium candidum, que participam da maturação, e de Penicillium glaucum, responsáveis pelo aspecto jaspeado dos queijos de pasta azul. As bactérias propiônicas, que atacam o lactato de cálcio dando ácido propiônico e gás carbônico, são responsáveis pela formação de “olhos”.
O tradicional queijo Serrano, por exemplo, é um produto artesanal conhecido por suas técnicas de fabricação. Fabricado com leite cru e sem a adição de um inóculo inicial, possui uma diversificada população microbiana indesejada, proveniente do próprio leite e também das condições higiênico-sanitárias às quais é submetido. Além dos microrganismos indesejáveis, estão presentes as bactérias ácido-lácticas (BAL). Essas são constituídas por um grupo heterogêneo de bacilos e cocos, produtores de ácido lático, microaerófilos, gram-positivos, catalise negativos.
Já a antiguidade do vinho se deve a características naturais da uva, sendo ela a única fruta que tem uma tendência natural à fermentação. Uma vez espremida, seu sumo logo entra em contato com as leveduras que farão o processo de fermentação, presentes em estado selvagem na casca, gerando o álcool. Isso favoreceu a que o homem logo descobrisse a bebida. Vinificações acidentais devem ter sido comuns em todos os lugares onde uva selvagem e povoamentos humanos se encontraram.
As primeiras vinhas foram provavelmente plantadas onde hoje se localiza a junção entre Turquia, Armênia e Geórgia e datam de, aproximadamente, sete mil anos atrás.
Porém, foram os gregos e, depois deles, os romanos que deram tamanha importância à bebida por causa dos cultos a Dionísio, deus grego do vinho. O vinho é constantemente citado no Velho Testamento da Bíblia, ora como um prazer, fonte de delícias, ora como um vício a ser evitado.
No século XIV, o comércio de vinho era intenso. As exportações de Bordeaux eram tão importantes que só seriam superadas em 1979. Mas apenas por volta do século XVII, surge uma nova perspectiva para o vinho: a experiência estética. Era o advento de uma classe social com dinheiro e ávida por sensações. Por essa época já eram conhecidas às técnicas para envelhecer e melhorar o vinho: era o início do vinho fino e isso só foi possível através do conhecimento da ação de determinadas bactérias.
A etapa da fermentação é a mais importante e mais complicada de todo o processo de produção de vinhos. Nela os químicos são vitais, pois é necessário um rígido controle da temperatura, supressão de microrganismos indesejados, presença adequada de bactérias de fermentação, nutrição adequada para estas bactérias, prevenção da oxidação, etc.. A escolha da bactéria adequada para o tipo da uva é fundamental. Para cada ml do suco, utiliza-se uma população de cerca de hum milhão de células de bactérias. Um controle da temperatura durante a fermentação alcoólica é necessário para facilitar o crescimento das bactérias e extrair os componentes de sabor e cor das cascas, permitir o acúmulo de produtos laterais desejados, e prevenir o extermínio das bactérias.
Já fermentação acética, que é a transformação do álcool em ácido acético por determinadas bactérias, conferindo o gosto característico de vinagre, foi identificada pela primeira vez por Pasteur, que mostrou que sem a participação da bactéria acética não há formação do vinagre. Com isso, ele provou que sempre que o vinho se transforma em vinagre, é devido à participação de bactérias acéticas que se desenvolvem na superfície do composto formando um véu, aliado ao enchimento dos acetificadores com material poroso servindo de suporte para o desenvolvimento de bactérias acéticas.
Os substratos não se acetificavam somente em contato com o ar, através da oxidação direta, havendo necessidade, sempre, da participação das bactérias acéticas. Para realizarem a acetificação, as bactérias acéticas necessitam do oxigênio do ar com isso multiplicam-se mais na parte superior do vinho que está sendo transformado em vinagre, formando um véu conhecido como “mãe do vinagre”, a espessura desse véu pode ser mais ou menos espesso de acordo com o tipo de bactéria.
Entretanto, as características dadas a cada tipo de vinho e também a transformação deste em vinagre está inteiramente ligada à bactéria aplicada a cada cultura.
Certamente, se não fosse a presença de bactérias e o posterior conhecimento destas, possivelmente, não teríamos essas duas iguarias e suas variedades, que são tão apreciadas pelas mais diversas culturas e povos diferentes, ao longo dos séculos.
Reynaud Torres