Em 26 de abril de 2011 por Elaine Azevedo
Sabemos que o inimigo mora ao nosso lado, mas até termos a certeza disso vivemos tranquilos, apenas sendo incomodados quando a mídia nos põe em contato com ele. Muitos de nós estamos até agora impactados com as cenas vistas pela televisão da tragédia ocorrida na Escola Municipal Tasso da Silveira, em Realengo, na Zona Oeste do Rio, onde no último dia 7 um ex-aluno assassinou 12 estudantes. O Brasil ficou triste, sensível, choroso. O mundo assistiu mais uma cena de horror que já ocorreu em outras escolas, em outros países. Nosso país agora está em mais uma lista, a de crimes ocorridos dentro da escola, um lugar que até então seria de segurança, de aprendizagem, de brincadeira e de harmonia.
Convivemos agora com as interrogações: de quem é a culpa? Como não tinha seguranças na porta da escola? Como o Estado permite que qualquer cidadão ande armado por aí? O que será da vida dessas crianças borradas de sangue? O que pensava o assassino frio e premeditado que levou a vida de inocentes que desejavam apenas o futuro? É uma situação que nos leva às lágrimas… Porém é um caso que não pode ser esquecido. Quando me lembro das entrevistas das crianças na televisão, chego a me emocionar. Fico pensando como elas estão, fico imaginando o que elas estão sentindo, o que será que passa no coração de cada uma delas. Um massacre que não combina com o ambiente idealizado pelo jovem executor, logo a escola, um lugar acolhedor. Vi as cenas e percebi o quanto era pacata aquela rua, aqueles moradores e aquela escola. Me lembrou muito uma rua do interior. Vi as mulheres em suas casas simples, de portões baixos, ninguém nunca poderia imaginar o que poderia acontecer. Aquelas casas humildes viraram abrigo, refúgio para aquelas crianças que se tornaram personagens de uma guerra. Uma guerra suja, onde só o inimigo estava armado de rancor, de fúria e de vontade de matar. Fiquei pensando o quanto somos frágeis, o quanto somos reféns da própria sorte, porque somos incapazes de reconhecer o inimigo.
Um inimigo tem várias faces. A escola naquela manhã abriu os seus portões para um jovem ex-aluno. Cidadão este que nunca deu problema, que fora, enquanto estudou ali, um aluno tímido, ou intimidado. Um rapaz que não problematizava, um aluno esquecido nos últimos bancos da sala de aula. Aquele que não perturbava a ordem. Às vezes aquele que é calado demais é o maior problema. Por trás da ausência de palavras e ações, aguarda o momento de aparecer realmente. Imagine como essa vida é surpreendente, uma pessoa que se esquivou do contato com os outros durante tanto tempo de repente é assunto no mundo inteiro. A sua ação pérfida e fria calou a voz de doze promissoras crianças. Cidadãs que sonhavam em ter uma carreira brilhante, que vislumbravam um futuro melhor para a sua família e que via na escola essa possibilidade. Eu, como educadora, fiquei muito sensibilizada, quando ouvi as crianças sobreviventes contarem o quanto gostam da escola. Percebi o quanto elas se sentiam acolhidas atrás daqueles portões. Senti o carinho recíproco dos professores e a organização daquela instituição que completa neste ano quarenta anos de serviços à comunidade e à educação.
A tragédia aconteceu e não tem mais volta. Vidas se foram e outras tantas estão modificadas. Famílias estão mutiladas, pais estão desconsolados. Adolescentes estão traumatizados. A sociedade está perplexa com mais um crime. Mas não é o fim. A escola já está de portas e corações abertos. Os muros já foram pintados de branco, porque todos desejam a paz. Os alunos já estão voltando. As paredes manchadas de vermelho receberão cores alegres, mistura de coragem, de fé e de desejo de renovar a esperança no futuro. Professores de escolas vizinhas estão se apresentando para dar aulas de amor e de solidariedade. Voluntários esperam os alunos para lhes dar lições de vida, para doarem esperança e amor. O Estado prepara mais uma campanha de desarmamento. Pena que teve que ocorrer uma barbárie tão grande, para que essa mobilização fosse novamente para as ruas. E assim os dias passam, a vida segue e as pessoas tentam esquecer essa manhã triste. Só espero que não se esqueçam que o inimigo não tem hora para se revelar. É um sinal de alerta. A sociedade e o Estado tem que ter um olhar mais sério e profundo para aqueles que são “diferentes”, para aqueles que não se destacam, para aqueles que guardam a indiferença dentro de si. E vamos seguindo confiantes, mas alertas para a maldade e crueldade do mundo.
Elaine Azevedo
Elaine Azevedo
1 de maio de 2011
Fatinha! Fiquei emocionada com o seu comentário! Obrigada pelo carinho! Você é uma grande educadora, apesar de não nos encontrarmos há tanto tempo, sempre tive notícias do seu belo trabalho com as crianças.Me lembro direitinho das aulas na sua casa, do sua paciência, do seu talento e da sua dedicação. As mãos continuam suadas! Beijos
Fátima Viana
26 de abril de 2011
Pois é, Elaine, um aluno calado no canto da sala que não incomoda, não perturba, muitas vezes não é observado e nem é lembrado. Ele muitas vezes nem é somado. Afinal pra quê se ele não dá nenhum trabalho, não é mesmo? É melhor dizer que ele é tão quietinho, tão “bonzinho”! Nós educadores precisamos estar muito atentos a estes alunos. Eles têm guardados segredos incontáveis, segredos difíceis de serem revelados, mas não impossíveis. Precisamos ser mais sensíveis a estas pessoas; precisamos prestar-lhes socorro. Um socorro que, apesar de não ser pedido com a boca é pedido com o olhar. Precisamos prestar mais atenção aos olhares e assim, quem sabe, evitaremos tragédias como a descrita em seu texto.
Beijos, minha querida! Sinto saudades de você, mas agora através do facebook estou sempre vendo suas fotos e matando um pouquinho as saudades, minha “menina das mãos molhadas”. Molhadas de tanta coisa: de carinho, de afeto, de amizade.
Beijos no coração!